Especial 130 anos

Cadopô: a moradia estudantil que abriga parte importante da história da Escola Politécnica da USP

“Eu era bem pequenininho, tinha cerca de quatro ou cinco anos. Ficava da janela da casa da minha avó, que ficava do outro lado da rua, observando toda aquela movimentação e me perguntando: o que que pode estar acontecendo lá?”.

O relato é do arquiteto Breno Berezovsky e descreve bem como era viver nos arredores da Casa do Politécnico, ou da, carinhosamente apelidada, Cadopô, moradia estudantil fundada em 1957 que foi, durante as suas quase duas décadas de existência, o palco de grande efervescência política e cultural da Escola Politécnica.

A Cadopô nasce como a primeira grande obra do Grêmio Politécnico. Pensada para abrigar estudantes que vinham de outras cidades e não tinham condições financeiras, a moradia estudantil ficava ao lado da antiga Escola Politécnica, mais precisamente na Rua Afonso Pena, 272, no bairro paulistano do Bom Retiro.

A construção da Casa foi resultado de uma mobilização de vários segmentos da sociedade. Além do apoio de muitos professores da Poli, a obra recebeu subsídios de diversas entidades públicas e privadas, e depois de anos no papel, a ideia finalmente tomou forma no final da década de 1950 com a ajuda de muitos calouros.

O edifício contava com dez andares onde eram distribuídos 40 apartamentos e moravam 110 estudantes. A intensa movimentação observada por Berezovsky, ia de encontro aos muitos eventos políticos e culturais dos quais a Cadopô foi palco em cerca de 20 anos de funcionamento. Entre bailes, partidas de futebol, rodas de samba, churrascos e calorosos debates políticos, a Casa passou a representar para os seus moradores e agregados, como descrito no livro de memórias Causos da  Casa do Politécnico, a

“acolhedora mãe de todos os cadopolitanos”.

“Gentil e hospitaleira, a Casa acolhia os novos estudantes que chegavam, na maioria calouros. Vinham de diferentes lugares; como uma família numerosa, cada qual com as suas características peculiares” diz “Gersão”, um dos antigos moradores da Casa, em trecho da obra. 

Um dos educadores do arquivo municipal (AHM) de São Paulo destaca que a construção do Casa do Politécnico representa grande importância, pois também demarcou uma mudança, ainda que incipiente, no perfil dos estudantes que frequentavam a Poli, e demonstrou o poder da organização dos alunos em prol de um objetivo já naquela época.

“A partir do momento que tem uma mobilização dos próprios estudantes para ter um moradia estudantil, percebe-se que começa uma mudança na feição social dos alunos da Poli. Além de pressionar os órgãos públicos, como a Prefeitura, eles mesmos promoveram diversos eventos direcionados a arrecadar dinheiro para a obra”. 

Cerca de 1000 estudantes passaram pela Casa em cerca de 13 anos da Cadopô funcionando como moradia estudantil. Após a transferência da Escola Politécnica para a Cidade Universitária, o edifício passou a integrar o Arquivo Histórico Municipal e hoje abriga a Torre da Memória, que funciona como um acervo de documentos históricos.

Uma Cadopô política

Forças opostas disputavam a hegemonia mundial na segunda metade da década 1950. De um lado, a grande potência ocidental americana; do outro, liderando o bloco soviético, a Rússia. Uma batalha político-ideológica estava travada. Ainda no fim da mesma década e início da próxima, aconteceu também a Revolução Cubana, responsável por implantar o socialismo no interior do mundo capitalista. 

Ambos os acontecimentos refletem na mente da juventude estudantil da época, que se tornava cada vez mais politizada. Mas no contexto nacional, o que se sobressai é a instauração do regime militar em 1964, acontecimento que estabelece profundos laços com a Casa do Politécnico, que foi abrigo de refugiados pela repressão.

Em Causos do Cadopô, um ex- aluno identificado como “Mumu” descreveu acontecimentos bem emblemáticos na moradia estudantil, sobretudo, após o decreto de legitimação, 1968, do AI-5, ato mais restritivo da ditadura. 

Ele conta, em relato, que a Cadopô dava o apoio possível para os seus conhecidos que eram militantes e faziam parte da resistência à ditadura, fosse através do oferecimento de uma refeição, de um pernoite ou de um pouso por alguns dias, além de discussões sobre a situação política do País. Entretanto, às vezes chegavam a Cadopô as notícias que ninguém queria ouvir. 

“Ás vezes [eles]  deixavam algum pertence para apanhar posteriormente e não apareciam mais. Só chegava a notícia que Fulano tinha “caído” ou mesmo tinha sido morto pela repressão. 

A participação da camada estudantil na redemocratização também é marcante na história da Casa do Politécnico. À medida que o regime militar perdia força, os estudantes passaram a se mobilizar e não se omitiram perante a injustiça. Entre, comissões, passeatas e uma série de ações, a Poli marcou seu lugar na luta pela democracia.  

O livro Causos da Casa do Politécnico faz parte do acervo da Biblioteca da Escola Politécnica. 

Leia mais

Escola Politécnica
Universidade de São Paulo

Expediente

Reitor: Carlos Gilberto Carlotti Junior
Vice-reitor: Maria Arminda do Nascimento Arruda
Escola Politécnica da USP
Diretor: Reinaldo Giudici
Vice-diretor: Sílvio Ikuyo Nabeta

Print Friendly, PDF & Email