FORMANDO ENGENHEIROS E LÍDERES

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Politécnico lança livro sobre a trajetória de um dos primeiros engenheiros negros do Brasil

O Doutor pela Escola Politécnica (Poli) da USP, Rafael Augusto Seixas Reis de Paula, está lançando o livro “A caminhada de um dos primeiros engenheiros negros do Brasil”, o qual aborda sobre a trajetória de José de Paula, avô de Rafael. O lançamento oficial acontecerá em uma live no Dia da Consciência Negra, próximo sábado, dia 20 de novembro, às 17h, no canal do YouTube e no Facebook da Editora Desconcertos, a qual é focada em publicar obras de autores ou sobre temas de negros.

A ideia para escrever o livro nasceu a partir do interesse de Rafael em compreender como ocorria a ascensão de certos grupos sociais no século XX no Brasil, visto que o País era ainda mais desigual naquele período. “Ser negro no Brasil do início do século XX era praticamente um atestado de que sua vida não seria nada fácil”, relata. Um exemplo disso é que, na época, eram raros os casos de pessoas negras que conseguiram cursar o ensino superior e obter um diploma.

“Dessa forma eu iniciei meu trabalho fazendo as seguintes reflexões. Como então, ocorriam a ascensão social dos negros no Brasil nessa época? O que explicaria esse fenômeno? Se a tendência natural era, mesmo após a abolição da escravidão, levar uma vida com poucas oportunidades profissionais, com baixa propensão a assumir profissões capazes de gerar retornos econômicos relevantes, em que o diferencial era a força dos seus braços, e não de seus neurônios, como alguns negros conseguiram seguir um caminho distinto da maioria dos demais?”

Com esses questionamentos em vista, Rafael decidiu analisar a ascensão social de pessoas negras por meio de casos de indivíduos comuns, os quais não tinham nenhum dom espetacular e raro de se encontrar, ou que fossem de famílias abastadas. Por isso, ele decidiu estudar a história de vida do seu avô, já que ela era mais próxima da trajetória da maioria dos negros brasileiros.

José de Paula nasceu no dia 7 de junho de 1911, e faleceu aos 99 anos, em 24 de agosto de 2010. Durante sua vida, José se tornou um dos primeiros engenheiros brasileiros negros ao se formar como Engenheiro Agrônomo, em 1933, na Escola Superior de Agronomia e Medicina Veterinária de Belo Horizonte, a qual atualmente é conhecida como Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade Ferderal de Minas Gerais (UFMG).

“As conquistas alcançadas por meu avô, José de Paula, permitiram o fim de um ciclo. As suas próximas gerações usufruíram de benefícios relevantes. Seus cinco filhos e, posteriormente, seus dez netos tiveram uma infraestrutura social básica fundamental para conseguir quebrar as amarras do racismo estrutural”, fala Rafael. Ao contrário de familiares próximos, todos os parentes diretos de José, seus cinco filhos e sete netos, se formaram em renomadas universidades e puderam estudar um segundo e até um terceiro idioma.

“Seus cinco filhos, por exemplo, conseguiram se formar nas principais universidades nos anos 1970 e 1980, período em que eram ainda raros os casos de filhos de negros que cursavam o ensino superior no Brasil”, explica o doutor. Dessa forma, José rompeu um ciclo e permitiu a seus descendentes manterem e até ultrapassarem o padrão social que o patriarca alcançou, “mesmo com a existência de práticas institucionais, históricas, culturais e interpessoais que continuamente destinam aos negros oportunidades mais restritas”, comenta o escritor.

Além de homenagear seu avô, Rafael pretende, com a obra “A caminhada de um dos primeiros engenheiros negros do Brasil”, gerar reflexões a partir da história de José que possam inspirar as pessoas a se tornarem cada vez melhores para sociedade, e mostrar um caminho de superação que foi o pilar para uma família que continua a progredir constantemente, apesar das adversidades. Ele também visa contribuir para as discussões raciais em prol de uma sociedade mais igualitária.

“Muito já foi discutido, diga-se de passagem. No entanto, a nossa história de mais de 300 anos de escravidão deixou profundas raízes e graves consequências para milhões de pessoas, mesmo após decorrido mais de um século da abolição da escravatura dos negros. Portanto, ainda temos muito a avançar. Quanto, precisamos entender com mais detalhes como alguns negros conseguiram, ao longo do século XX, uma significativa ascensão social.” 

Para isso, durante o processo de construção do livro, Rafael buscou entender sobre pontos relacionados ao racismo no Brasil e as desigualdades geradas por isso, como “por que ainda somos uma sociedade racista? Por que a cor de pele é ainda um fator que limita o acesso das pessoas a inúmeras oportunidades de trabalho no Brasil?”. Ele também buscou compreender as razões de as pessoas brancas serem a grande maioria dos ocupantes de cargos de poder em todas as esferas brasileiras, como a presidência da república, à frente de empresas e na corte de justiça.

Rafael expressou que se sente muito feliz e privilegiado por poder contar a história de seu avô. Além disso, ele explicou que a trajetória de José é um exemplo de como era complexo a ascensão social dos negros no incio do século XX no Brasil. Por isso, “homenageando o meu avô, estou também homenageando todos os negros que viveram no século XX no Brasil e sentiram na pele inúmeras dificuldades em proporcionar a seus descendentes uma vida com mais qualidade”.

Saiba mais detalhes sobre o livro.

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