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O PRIMEIRO SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO
Sendo um dos empreendimentos mais ambiciosos e estrategicamente significativos da história recente do Brasil, o Submarino de Propulsão Nuclear (SN-BR) foi formalizado em 2012, envolvido no Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB)[1]. Construir um submarino deste porte transcende aquilo que chamamos de engenharia. É um avanço tecnológico e científico muito maior do que podemos imaginar. O programa não somente adquire meios navais, mas também configura-se como um Projeto de Estado, com profundas implicações na defesa nacional, no desenvolvimento tecnológico e industrial e na capacitação de recursos humanos altamente qualificados.
Origem
A decisão formal da Marinha do Brasil de buscar o desenvolvimento de um submarino de propulsão nuclear materializou-se entre 1978 e 1979, com a criação do sigiloso “Projeto Chalana”[2]. Este programa pioneiro tinha dois focos principais: o domínio do ciclo do combustível nuclear (Projeto Ciclone) e o desenvolvimento de um reator nuclear para propulsão naval (Projeto Remo)[3].
A criação do SN-BR, contudo, só teve início de fato em 6 de julho de 2012, no Escritório Técnico de Projetos da Coordenadoria-Geral do Programa de Desenvolvimento de Submarino com Propulsão Nuclear (COGESN), localizado na cidade de São Paulo. Podemos dizer que sua história remonta ao Almirante Álvaro Alberto, personalidade que emprestará seu nome ao submarino.
O Almirante Álvaro Alberto da Motta e Silva, nascido no Rio de Janeiro em 22 de abril de 1889, foi uma figura notável na história da ciência e tecnologia do Brasil. A Escola Naval lhe deu estrutura para que, após sua formação, iniciasse sua carreira militar na Marinha Brasileira, com uma jornada dedicada ao conhecimento e à soberania nacional [4].
Não se limitando à carreira naval, expandiu seus horizontes acadêmicos, graduando-se em Física e Engenharia Geográfica pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro e, posteriormente, aprimorando seus estudos na Ecole Centrale Technique em Bruxelas, na Bélgica.
Sua contribuição mais emblemática foi a articulação e fundação do Conselho Nacional de Pesquisas, em 1951, hoje conhecido como Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Na presidência do órgão, o Almirante foi peça-chave na criação de algumas das mais importantes instituições científicas do país, como o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), o Instituto de Pesquisas da Amazônia (INPA) e a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), esta última idealizada por ele para gerir o desenvolvimento do setor nuclear no Brasil. Sua liderança também foi reconhecida pela comunidade científica nacional, presidindo a Academia Brasileira de Ciências (ABC) em dois mandatos (1935-1937 e 1949-1951) e a Sociedade Brasileira de Química.
Transcendendo as fronteiras nacionais, atuou como representante do Brasil na Comissão de Energia Atômica (CEA) da Organização das Nações Unidas (ONU), defendendo os interesses do país no cenário global em um período crucial da corrida tecnológica pós-Segunda Guerra Mundial.
O Almirante era um defensor fervoroso da ideia de que o desenvolvimento científico e tecnológico estava intimamente ligado à prosperidade do país. Essa convicção o levou a investir maciçamente no potencial humano, estabelecendo as bases para a pesquisa científica moderna no Brasil. Seu legado perdura não apenas nas instituições que ajudou a criar, mas também no nome do primeiro submarino brasileiro com propulsão nuclear, o SN-BR Álvaro Alberto, uma justa homenagem ao homem que abriu o caminho para a autonomia tecnológica do Brasil no campo nuclear [5].
Principais Posições e Títulos:
- Formado pela Escola Naval como Oficial da Marinha do Brasil.
- Graduado em Física e Engenheiro Geógrafo pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro.
- Professor Catedrático do Departamento de Físico-Química da Escola Naval.
- Presidente da Sociedade Brasileira de Química (1920-1928).
- Presidente da Academia Brasileira de Ciências (1935-1937 e 1949-1951).
- Representante do Brasil na Comissão de Energia Atômica da ONU.
- Idealizador e primeiro Presidente do CNPq (1951-1955).
- Idealizador da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN).
ORIGEM
O VISIONÁRIO POR TRÁS DO LEGADO NUCLEAR BRASILEIRO
AMAZÔNIA AZUL E A SEGURANÇA NACIONAL
Estendendo-se por cerca de 5,7 milhões de km², a “Amazônia Azul” é como se denominaram as águas marítimas sob jurisdição do Brasil, as quais somente o país pode explorar economicamente[6]. Esta região é de vital importância econômica, abrigando rotas comerciais cruciais, ricas reservas de petróleo e gás (incluindo as camadas do pré-sal), recursos pesqueiros e uma biodiversidade marinha significativa.
Amazônia Azul: sociedade precisa conhecer a importância do mar brasileiro. – Foto: Centro de Excelência para o Mar Brasileiro – CEMBRA
Sua riqueza e tamanho também a tornam vulnerável, demandando capacidades avançadas de vigilância, controle e defesa para assegurar a soberania nacional e a proteção dos interesses brasileiros.
Com a descoberta das vastas reservas de petróleo no pré-sal a partir de 2006 e a formalização do conceito de “Amazônia Azul”, tornou-se concreta uma estratégia de defesa, a qual trouxe apoio político e público necessário para sustentar os elevados custos e os longos cronogramas associados ao PROSUB e, em particular, ao SN-BR.
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO DE SUBMARINOS (PROSUB)
Ilustração esquemática do primeiro submarino com propulsão nuclear brasileiro - Foto: DGDNTM - Marinha Brasileira.
Lançado oficialmente em 2008, com um acordo de parceria estratégica com a França [7], o PROSUB é um programa multifacetado, que busca não apenas a construção dos submarinos, gerenciados pela COGESN, mas também o desenvolvimento tecnológico nacional e o fortalecimento da base industrial de defesa, além de promover a capacitação de profissionais altamente qualificados.
Seus principais componentes incluem:
- Construção de quatro submarinos de propulsão diesel-elétrica (S-BR) da classe Riachuelo, baseados no modelo francês Scorpène, mas adaptados às necessidades da Marinha Brasileira: o S-BR1 Riachuelo (S40), S-BR2 Humaitá (S41), S-BR3 Tonelero (S42), os três atualmente já entregues e lançados ao mar, e Almirante Karam (S43), antigo Angostura, previsto para o fim de 2026. Esta etapa é fundamental para a transferência de tecnologia e para o aprendizado industrial e operacional progressivo.
- Projeto e construção do primeiro submarino brasileiro de propulsão nuclear (SN-BR), o submarino Álvaro Alberto. Este é o componente mais complexo e tecnologicamente avançado do programa.
- Desenvolvimento e construção de uma nova e moderna infraestrutura industrial e de apoio logístico no Complexo Naval de Itaguaí (CNI), no estado do Rio de Janeiro. Este complexo inclui o Estaleiro de Construção (ESC), a Unidade de Fabricação de Estruturas Metálicas (UFEM) e a Base Naval de Submarinos (BNS).
S-BR1 Riachuelo (S40), primeiro da classe dos quatro submarinos convencionais com propulsão diesel-elétrica - Foto: PROSUB - Marinha Brasileira.
O projeto foi dividido em fases, iniciando-se com os submarinos convencionais (S-BRs) antes de avançar para o SN-BR, permitindo um desenvolvimento progressivo de capacidades da indústria nacional, que já se concretiza em empresas como a Itaguaí Construções Navais (ICN) e a Nuclebrás Equipamentos Pesados S.A. (NUCLEP), além da própria Marinha.
Com isso, o PROSUB, junto com o SN-BR, formam um grande pilar do investimento tecnológico a longo prazo, proporcionando importantes ativos para nosso país.
DESAFIOS DO PROJETO DO SN-BR
O Corpo Técnico de Projeto do SN-BR (CTP-SNBR) é composto por membros da Marinha do Brasil com treinamento especializado na França, a partir do acordo tecnológico criado. Para garantir a retenção desse conhecimento e o desenvolvimento contínuo de recursos humanos especializados, foi criada a empresa estatal Amazônia Azul Tecnologias de Defesa S.A. (AMAZUL).
Vinculada ao Ministério da Defesa por intermédio do Comando da Marinha, a AMAZUL tem como objetivo promover, desenvolver, transferir e manter tecnologias necessárias às atividades do Programa Nuclear da Marinha (PNM), do PROSUB e do Programa Nuclear Brasileiro (PNB) de forma mais ampla.
A colaboração com universidades e institutos de pesquisa é outro aspecto vital do PROSUB, estabelecendo intercâmbios com aproximadamente 20 instituições de ensino e pesquisa. O programa ainda constatou que existem cerca de 400 empresas nacionais no processo de nacionalização de componentes, que antes necessitavam da importação de tecnologias desenvolvidas no exterior.
S-BR1 Riachuelo (S40), primeiro da classe dos quatro submarinos convencionais com propulsão diesel-elétrica - Foto: PROSUB - Marinha Brasileira.
Entre as instituições de ensino e pesquisa, destacam-se:
– Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP): Possuindo um histórico de mais de 60 anos de parceria com a Marinha na área de Engenharia Naval, recentemente foram incluídas novas disciplinas e até mesmo uma opção de habilitação em Engenharia Nuclear nos cursos de Engenharia de Materiais e Metalúrgica, visando atender às demandas da engenharia naval e do setor nuclear, incluindo o submarino. Teses de mestrado e doutorado desenvolvidas na USP abordam temas relevantes para o projeto de submarinos, como o desenvolvimento de modelos livres (MLS) no contexto do antigo projeto SNAC (Submarino Nuclear de Ataque Convencional), precursor conceitual do SN-BR.
– Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPE/UFRJ): Participa ativamente do desenvolvimento de tecnologias para o PROSUB, por meio do Laboratório de Tecnologia Submarina (LabSonar), focado em sonares e acústica submarina. Há também envolvimento em outras áreas potenciais, como sistemas de remoção de gases e postos de suprimento nuclear para submarinos.
– Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN): desempenha um papel histórico e contínuo, crucial na pesquisa e desenvolvimento do ciclo do combustível nuclear e de reatores, em colaboração com o Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP).
A relação entre o projeto de defesa e o meio acadêmico-científico é harmônica. O SN-BR não é apenas um consumidor de expertise, mas um motor para seu desenvolvimento no país. Os complexos desafios de engenharia impostos pelo projeto geram temas para pesquisas e discussões acadêmicas que transcendem, em muito, as aplicações relacionadas ao projeto do submarino, impulsionando a fronteira do conhecimento nas instituições de ensino. Por sua vez, a necessidade de formar engenheiros e cientistas com as competências demandadas pelo programa estimula a criação e adaptação de currículos especializados nas universidades, contribuindo para a capacitação nacional de longo prazo em áreas tecnológicas críticas.
Já na parte de arquitetura e construção prática deste projeto, o Brasil viu a necessidade de um complexo altamente especializado, com domínio de tecnologias de construção avançadas e da superação de desafios da engenharia, surgindo assim o Complexo Naval de Itaguaí, epicentro dessas atividades [9].
O governo brasileiro, por meio da Marinha do Brasil, construiu o complexo especificamente projetado para atender às demandas do PROSUB, incluindo a construção e manutenção de submarinos convencionais e nucleares. Este complexo, conhecido como PROSUB-EBN, compreende instalações-chave, como:
– Unidade de Fabricação de Estruturas Metálicas (UFEM): uma unidade industrial de alta tecnologia, onde se inicia efetivamente a construção dos submarinos. Suas capacidades incluem o alinhamento e união de subseções cilíndricas do casco resistente, a fabricação de partes estruturais, tubulações, dutos e suportes, além da montagem de materiais e equipamentos nas seções do submarino, sendo considerada a “primeira parte da infraestrutura” que capacitará o país a construir e manter submarinos de propulsão convencional e nuclear.
– Itaguaí Construções Navais (ICN): É uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) formada inicialmente pela Odebrecht (atual Novonor) e pelo Naval Group (França), com o objetivo de construir os submarinos do PROSUB e absorver a tecnologia transferida. A ICN será a responsável pela construção das seções de qualificação e da Seção C preliminar do SN-BR Álvaro Alberto, atividades realizadas na UFEM.
– Estaleiros de Construção e Manutenção e Base Naval (EBN): este conjunto de instalações é destinado à montagem final, lançamento, operação e manutenção dos submarinos. Inclui um estaleiro principal, oficinas, um complexo de manutenção especializado para troca de combustível nuclear e manutenção de reatores, um elevador de navios (shiplift) com capacidade para 8.000 toneladas, cais e docas adequadas.
REFERÊNCIAS
- MARINHA BRASILEIRA. Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB). Disponível em: [https://www.marinha.mil.br/sites/default/files/snbr.pdf]. Acesso em: 15 de jun. 2025.
- MARTINS FILHO, João Roberto, 2011. O projeto do submarino nuclear brasileiro. Disponível em: [https://www.scielo.br/j/cint/a/DnWMLkPj5h9nC7QphZ8PzZH/?format=html&lang=pt] . Acesso em: 16 de jun. 2025.
- CC FRÖHLICH, Thomas Borges, 2020. A Dinâmica Ascendente da Estratégia: o caso do submarino nuclear brasileiro. Disponível em: [https://www.marinha.mil.br/egn/sites/www.marinha.mil.br.egn/files/CEMOS_120_MONO_CC_CA_FRO%CC%88HLICH.pdf]. Acesso em: 21 de out. 2025.
- MARINHA BRASILEIRA. Almirante Álvaro Alberto. Disponível em: [https://www.marinha.mil.br/dgdntm/sites/www.marinha.mil.br.dgdntm/files/arquivos/video_almirante_alvaro_alberto.mp4] . Acesso em: 16 de jun. 2025.
- DGDNTM – MARINHA BRASILEIRA. Nosso Patrono. Disponível em:[https://www.marinha.mil.br/dgdntm/node/71] . Acesso em: 16 de jun. 2025.
- CEMBRA – Centro de Excelência para o Mar Brasileiro. Amazônia Azul: sociedade precisa conhecer a importância do mar brasileiro. Disponível em: [https://cembra.org.br/pt-br/amazul] . Acesso em: 16 de jun. 2025.
- COLLETA, Ricardo. PROSUB – Itamaraty Brasil negocia com França acordo para combustível nuclear de submarino. Folha de São Paulo, 2024. Disponível em: [https://www.defesanet.com.br/e_prosub/prosub-itamaraty-brasil-negocia-com-franca-acordo-para-combustivel-nuclear-de-submarino/] Acesso em: 15 de jun. 2025.
- REDAÇÃO FORÇAS DE DEFESA. Com orçamento insuficiente, submarino de propulsão nuclear brasileiro só ficará pronto em 2040. Poder Naval, 2025. Disponível em:[https://www.naval.com.br/blog/2025/03/24/com-orcamento-insuficiente-submarino-de-propulsao-nuclear-brasileiro-so-ficara-pronto-em-2040/] . Acesso em: 30 de set. 2025.
- SUBMARINOS – Defesa e Desenvolvimento para o Brasil. Rio de Janeiro: Versal Editores, 2014. Disponível em: [https://www.marinha.mil.br/prosub/sites/www.marinha.mil.br.prosub/files/livro_submarino.pdf]. Acesso em: 16 de jun. 2025.