FORMANDO ENGENHEIROS E LÍDERES

FORMANDO ENGENHEIROS E LÍDERES

Prof. Dr. Alexandre Albuquerque - 1937-1938

AlexandreAlbuquerqueExercício: 1937 a 1938

No dia 14 de novembro de 1880, no Bairro do Brás, em São Paulo, nasceu Alexandre Albuquerque. Membro de uma família originária do Rio Grande do Sul, tinha onze irmãos, filhos do casal Ephigênia e Frederico Albuquerque. Seu pai como agrônomo e botânico, foi o responsável por plantar as palmeiras imperiais na rua do Paissandú, na cidade do Rio de Janeiro e devido à aproximação com o Imperador esteve ligado à criação do Jardim Botânico.

Albuquerque estudou no Colégio Militar e cursou, por pouco tempo, a Escola de Engenharia do Rio de Janeiro, dado que por volta de 1899 transferiu-se para a Escola Politécnica de São Paulo. Já em 1903, participou da fundação do Grêmio Politécnico, sendo seu primeiro presidente.

No período de sua gestão no Grêmio, ocorreu a primeira passeata dos alunos da Escola pelo centro da cidade. Em protesto, os estudantes saíram às ruas com um boneco encerrado em um caixão, representando sua indignação frente a um deputado da época que propunha aumentar as taxas de matrícula nas escolas estaduais. Malograda, a manifestação acabou em confronto com a polícia.

Paula Souza, ao saber da “travessura” de seus alunos passou-lhes um sermão, questionando também se haviam reagido aos ataques da polícia. Os estudantes afirmaram que resistiram à truculência policial com pancadas, o que, por sua vez, deixou o diretor cheio de orgulho pela coragem dos discentes.

Em 1905, Albuquerque graduou-se em engenharia civil, recebendo das mãos do professor Antonio Francisco de Paula Souza – fundador e diretor da Escola – na ocasião paraninfo da turma, seu diploma. No dia da formatura, como orador da classe, fez discurso caloroso, ganhando a título de prêmio uma viagem à Itália, por meio da qual tomou conhecimento detalhado acerca da arquitetura renascentista, o que, aliás, lhe rendeu a escrita de um trabalho erudito sobre o Renascimento Italiano.

No discurso de formatura, invocava a importância social da engenharia como motor impulsionador das mudanças no cotidiano das pessoas, através, por exemplo, da construção de pontes, estradas, ruas, estações de esgoto, dentre outras estruturas que, por certo, transformavam o panorama das localidades onde eram implantadas. Enquanto orador relatou ainda o ofício da profissão aos engenheiros: “Os antigos guerreiros mandavam gravar em seus escudos os lemmas que no mais encarniçado da peleja serviam para accender o fogo sagrado do heroísmo. Nós recebemos hoje a investidura de guerreiros. É justo, pois que vos diga o que mandamos esculpir em nossos escudos. A nossa vida não está escrita no Livro do Destino. Nós é que vamos escreve-la com a força imensa que possuímos – a ENERGIA DA VONTADE. E, se com esta combinamos uma outra – a NOBREZA DE CARATER, então triunpharemos tanto no mundo físico como no mundo moral.Estas forças têm para ponto de applicação o TRABALHO. É aqui que encontraremos todas as felicidades as seguintes palavras:ENERGIA, CARACTER, TRABALHO” (Revista Polytechnica, 1905).

Dentre os anos de 1907 e 1909, trabalhou junto a Francisco de Paula Ramos de Azevedo no escritório de engenharia-arquitetura, acabando depois por abrir o seu próprio. A questão é que nesse período, anterior mesmo às obras de urbanização que viriam a ser realizadas na gestão do prefeito Francisco Prestes Maia, vinha sendo maturado um conjunto de ideias no sentido da transformação urbana da capital paulista. O professor Albuquerque juntamente com outras personalidades da época, como Conde Prates, Rodrigues Alves, Barão de Boicana e o próprio Francisco de Paula Ramos de Azevedo, versou um projeto já em 1910 acerca da construção de prédios, abertura de avenidas, dentre outros empreendimentos, que visavam, em especial, a reurbanização da região de Santa Ifigênia aos moldes da influência arquitetônica francesa.

Não obstante, o Estado e o Município vetaram o projeto com a alegação de que acarretaria altos custos, contratando então Joseph Antoine Bouvard (arq. Paris, que se encontrava no Rio de Janeiro a caminho de Buenos Aires). Tal situação contrariou Albuquerque que, seguindo o propósito da fundação da Escola Politécnica, aventou questionamentos acerca dos porquês das escolhas recaírem sobre engenheiros estrangeiros em detrimento aos formados no país.

De toda forma, dentre seu rol de importantes obras estão a Capela e o Convento de Santa Thereza, onde hoje funcionam respectivamente, a Pontifícia Universidade Católica (PUC) e a Capela de Santa Thereza, para a realização dos quais, inclusive, estudou arquitetura religiosa. Outro projeto de sua autoria foi o Convento da Divina Providência e a Catedral Metropolitana da Sé, a cuja construção dedicou-se (juntamente com Maximiano Hehl e o Dr. Jorge Krug) de 1919 até a sua morte em 1940.

Desde jovem, trilhou esforços no sentido de regulamentar a profissão e segundo o depoimento de seus filhos, Alexandre Serpa Albuquerque e João Serpa Albuquerque, “felizmente ele chegou a ver a promulgação da lei regulamentando a profissão no ano de 1933. Inclusive, foi um dos primeiros a se inscrever no CREA, mas somente se registrou como arquiteto. É que ele era arquiteto por natureza, ele nunca trabalhou em outros ramos da Engenharia Civil.” (SANTOS, Maria Cecília Loschiavo dos. Entrevista com Alexandre S. de Albuquerque e João S. Albuquerque, 1982).

O mestre era um apaixonado pela arte da fotografia, possuía diversos tipos de câmeras – Kodak, Cine-Kodac e por volta de 1935, a Zeiss Movikon -, com as quais documentou imagens, sem dúvida, valiosas como representantes de facetas históricas do período. Nesse sentido, guardava fotos da Catedral paulistana; do Museu do Louvre; do Seminário do Ipiranga, além, é claro, de cenas da família que compunham o seu acervo pessoal.

Outra linha de atividades com a qual teve estreita ligação foi a do veio artístico paulista, tanto assim, que organizou o II Salão Paulista de Belas Artes e participou da fundação da Escola de Belas Artes – na qual também assumiu a função de docente – e presidiu o Sindicato dos Artistas. Nesse meio conheceu Candido Portinari, por quem teve um retrato pintado, Olga Mary, Paulo Rossi Osir, Waldemar da Costa, dentre outras figuras da época.

No papel de ex-aluno, Albuquerque fundou a Associação dos Antigos Alunos da Escola Politécnica. No dia 7 de janeiro de 1935, foram criados os vinte e cinco artigos que deveriam regê-la e foi eleito o primeiro presidente do Conselho Diretor. No primeiro capítulo, a Associação pregava “uma sociedade destinada a promover a aproximação intelectual e social e a mutua cooperação entre os engenheiros diplomados pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo ou que façam parte do seu corpo docente, e a manter o interesse por tudo que se refira ao desenvolvimento e progresso desse estabelecimento de ensino.” (Revista Politécnica, 1935).

No mesmo ano, a diretoria do Grêmio Politécnico demitiu-se inteiramente. Para que o Grêmio não ficasse sem orientação, um grupo de sócios dirigiu-se a Albuquerque, seu fundador e presidente honorário, pedindo-lhe que o dirigisse até que fossem efetuadas novas eleições. Aceitando prontamente, o mestre, no entanto, considerou “o momento oportuno para a realização da reforma dos Estatutos do Grêmio.” (SANTOS, Maria Cecília Loschiavo dos. Entrevista com Alexandre S. de Albuquerque e João S. Albuquerque, 1982). Após a reforma, as ditas eleições ocorreram por meio do novo estatuto.

Como professor foi extremamente ativo na instituição. Em 1917, lecionou Composição Geral e História da Arquitetura e Estética. Também durante vinte anos (1917-1937) dirigiu a biblioteca, onde introduziu um sistema de classificação de livros denominado “Dewey” que em muito contribuiu aos usuários, facilitando seu acesso ao material. Além do que, pertenceu ao Conselho do Instituto de Pesquisas Tecnológicas e entre os anos de 1932 e 1936 assumiu por duas vezes a função de secretário da Escola.

No que se refere às aulas, o docente preparava súmulas do conteúdo a ser dado, deixando-as sob a mesa na sala de aula com o intuito de que os alunos mais próximos pudessem pegá-las para estudar a matéria. A despeito de então ser professor da cadeira de História das Construções Civis e Higiene das Habitações, Albuquerque também organizava o acervo fotográfico de História da Arquitetura, unindo, assim, os dois componentes que mais apreciava: fotografia e arquitetura.

Quando do estopim da Revolução de 1932, o mestre Albuquerque, em conjunto com diversos professores da Poli ,organizou a Comissão Inspetora das Delegacias Técnicas (CID) criada pelo governador Pedro de Toledo e fornecia apoio logístico aos engenheiros para a produção de material bélico. Por todos esses fatores, denota-se que também nesse quadro histórico, Albuquerque deixou suas marcas.

Com a morte de Rodolfo Baptista de São Thiago, foi nomeado diretor da Escola Politécnica, exercendo o cargo durante os anos de 1937 e 1938. Momento esse em que o país passava por profundas transformações políticas e econômicas, advindas da ditadura estabelecida com o Estado Novo. De modo particular no Estado de São Paulo, essas mudanças se refletiram, dentre outros acontecimentos, com a instalação de novas indústrias e a nomeação de Adhemar Pereira de Barros como interventor.

Nesse bojo, é interessante notar que Albuquerque também teve uma trajetória política. Participou ativamente da Revolução de 1932 em favor dos interesses paulistas e por duas vezes foi vereador do Partido Republicano Paulista, a primeira de 1926 a 1930 e a segunda de 1934 a 1937, ano em que Getúlio Dornelles Vargas instituía a si o poder ditatorial (1937-45).

No ano de 1936, o professor cujas construções parecem ter seguido o ideário humanista italiano e o estilo gótico/neo-colonial, afastou-se da Escola Politécnica de São Paulo já apresentando sintomas que denunciavam problemas de saúde. Em 1940 veio a falecer, ainda novo, contando 60 anos de idade. Sua trajetória de vida revela, assim, as muitas facetas de um homem que exerceu múltiplas funções, desde a primeira presidência do Grêmio de Estudantes, até a vereança pelo Partido Republicano Paulista por duas vezes e a própria direção da Escola Politécnica. Combinou tudo isso com seu grande interesse pela arquitetura, fotografia e pintura, realizando obras que ainda marcam a paisagem urbana de nossa cidade.

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