FORMANDO ENGENHEIROS E LÍDERES

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Em aula inaugural na Poli para alunos da pós-graduação da USP, ele contou como utiliza a neurociência em prol da transformação social.

“Universidade, Estado, Democracia: Desafios e Perspectivas para a Ciência Brasileira” foi o tema da aula inaugural aos ingressantes dos cursos de pós-graduação da USP em 2017. A palestra foi proferida por Miguel Nicolelis, neurocientista graduado em medicina e doutor em fisiologia geral pela USP, além de um dos 20 maiores cientistas da atualidade segundo a revista Scientific American. O evento ocorreu nesta quinta-feira (06/04), no Auditório Professor Francisco Romeu Landi, no Prédio da Administração Central da Escola Politécnica da USP (Poli-USP).

Ao dar as boas-vindas a Nicolelis, José Roberto Castilho Piqueira, diretor da Poli, enfatizou o momento difícil pelo qual a ciência brasileira passa nesse momento. Para ele, os cortes de investimento na área dificultam, em muito, a atuação e a formação dos cientistas no país. A saída para essa situação, segundo ele, só será encontrada por meio da atuação conjunta de estudantes e docentes.

O diretor concluiu seu pronunciamento com um agradecimento a Nicolelis, mencionando a honra que a presença do cientista significa para a Poli. . Para finalizar, fez um apelo para a extinção da violência seja contra os alunos da USP ou a contra a própria ciência. “Vamos nos juntar para que a violência, seja ela de qualquer tipo, acabe”.

O presidente do Grêmio Politécnico, Luca Artiolli, mencionou a necessidade de uma mobilização dos alunos, professores, pesquisadores e funcionários em busca de um ensino universitário melhor.

Questão de soberania – A aula de Nicolelis começou em um clima de descontração. Após agradecer o convite para ministrar o evento, o neurocientista afirmou que, apesar de ter se formado em medicina na Universidade, ele se considera um “engenheiro amador” e politécnico, uma vez que já frequentou muito a Escola em seu tempo de graduação.

“Defender a pesquisa científica é uma questão de soberania nacional. Os países que renunciam a ela [pesquisa] renunciam a sua própria independência como nação”. Esse foi o raciocínio que deu início à apresentação do professor da Duke University, localizada nos Estados Unidos. Para sustentar o argumento, ele mostrou dois gráficos que comprovavam a tese: em um deles, havia a correlação entre a capacidade de inovação de um país e o quanto o mesmo investia de seu Produto Interno Bruto (PIB) em desenvolvimento científico. As nações que mais despendiam verbas eram as que mais geravam riquezas provindas de produtos tecnológicos, como os EUA. O segundo gráfico, que apontava a porcentagem de cientistas para cada mil pessoas de um país, demonstrava o atraso do Brasil nesse quesito, quando comparado a países do topo da lista, como a Finlândia.

Para Nicolelis, a ciência brasileira recebeu um investimento “nunca antes visto no mundo” com o Programa Ciências Sem Fronteiras, criado em 2011 com o intuito de promover a internacionalização dos pesquisadores brasileiros. Ele reforçou que é imprescindível que a sociedade brasileira exija a manutenção desse investimento. “De forma alguma podemos renunciar as nossas utopias”. Rebatendo os argumentos de que o Brasil não possui potencial de inovação tecnológica, o professor deu o exemplo de Santos Dumont, inventor do voo controlado.

A ciência como agente de transformação social – Miguel Nicolelis coordena um programa que visa utilizar a ciência de ponta no incentivo do desenvolvimento social de Macaíba, cidade que fica à 14 quilômetros de Natal, no Rio Grande do Norte. É um dos Estados brasileiros que detém baixos índices econômicos e sociais.

Nessa cidade, ele montou o Campus Cérebro, um complexo de ensino, pesquisa e extensão em neurociência voltado ao atendimento das crianças da região. Lá, as mães recebem um serviço de pré-natal e os pequenos um ensino de tempo integral que vai até o fim do Ensino Médio. Para quem já é formado, há a possibilidade de trabalhar no Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edmond e Lily Safra (IINN-ELS). Está prevista também a construção de uma faculdade especializada para formar pesquisadores na área.

O neurocientista se orgulha do feito e mostrou, durante a aula, os bons resultados que a estrutura já rendeu. Segundo ele, o índice de evasão escolar dos alunos do ensino fundamental baixou para 5% em Macaíba. . Além disso, já foram realizados aproximadamente 60 mil atendimentos médicos desde 2008.

Chute que ganhou o mundo – Nos últimos minutos de aula, Nicolelis contou para o público como ele conseguiu organizar a equipe com cientistas de mais de 25 países para o projeto que resultou no chute inicial da Copa do Mundo, ocorrida no Brasil em 2014.

O grupo de pesquisadores conseguiu fazer com que um homem paraplégico há mais de 10 anos chutasse uma bola em campo. Eles utilizaram uma interface que conseguia captar as ondas eletromagnéticas no cérebro do paciente e movimentar o pé do mesmo – por meio de um exoesqueleto – quando ele tivesse a intenção. O feito foi considerado uma das inovações mais importantes da ciência nos últimos anos pela revista Nature, uma das mais consagradas do segmento.

Veja no Flickr da Escola as fotos do evento. A Poli-USP deve disponibilizar, em breve, o vídeo com a aula magna ministrada por Nicolelis em seu site e redes sociais.

(Amanda Panteri)

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