FORMANDO ENGENHEIROS E LÍDERES

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Trabalho premiado pela USP ajuda a diminuir um dos grandes problemas da utilização do vento como fonte de energia, a poluição sonora

O Brasil é um dos países que mais utilizam energia renovável para atender a toda a sua demanda. A matriz energética do País está entre as mais “limpas”, com 45,3% de sua produção proveniente de fontes renováveis como recursos hídricos, biomassa e etanol, ou seja, a que menos utiliza combustíveis fósseis, como óleo e gás, para suprir a energia necessária para iluminar cidades, permitir que as indústrias funcionem, e abastecer os lares dos brasileiros. Pensando no desenvolvimento de fontes de energia renovável pela indústria brasileira, o engenheiro Joseph Youssif Saab Junior desenvolveu a tese de doutorado “Ruído de bordo de fuga – desenvolvimento e aplicação de ferramenta para avaliação e projeto de aerofólios para turbinas eólicas”, que propõe soluções para otimizar a geração de energia eólica, solucionando um dos maiores problemas na sua implementação: o ruído aerodinâmico produzido pelas turbinas em movimento.

O trabalho foi orientado pelo professor do Departamento de Engenharia Mecânica da Poli-USP, Marcos de Mattos Pimenta, e recebeu o prêmio principal no último prêmio Tese Destaque USP, cuja cerimônia oficial foi realizada no dia 28 de setembro, no auditório do Conselho Universitário, na Reitoria da USP.

Ao longo dos cinco anos de pesquisa, o doutorando realizou uma extensa pesquisa bibliográfica sobre o assunto, cobrindo 30 anos de produção de conhecimento na área, o que pode servir como base para projetos futuros na área, e participou de eventos específicos da indústria de energia eólica, onde descobriu quais os principais desafios enfrentados no projeto e fabricação de turbinas, e assim optou por se dedicar à questão do ruído aerodinâmico de bordo de fuga, por ter experiência na área de mecânica dos fluídos. Seja na região Nordeste ou Sul, os locais que possuem as condições naturais mais propícias para a instalação de fazendas eólicas no País são densamente habitados, o que torna a poluição sonora um transtorno para as comunidades vizinhas. Joseph ressalta que “85% da população está na costa leste, exatamente onde estamos instalando vários parques eólicos”.

Tendo em vista este desafio para a ampla utilização dessa fonte energética renovável – já que a eficiência do equipamento cresce com seu tamanho, mas o ruído também-, o pesquisador desenvolveu uma modelagem matemática que, na forma de um programa de computador,  prevê, ainda em fase de projeto, quanto ruído o aerofólio a ser empregado na turbina emitirá, antes mesmo de ser fabricado. Utilizando o próprio software, o pesquisador desenvolveu a família de aerofólios SP (Saab-Pimenta) que tem aerofólios mais silenciosos e mais eficientes do que os conhecidos para grandes turbinas eólicas, o que confere inovação ao trabalho.

Além desta questão da poluição sonora, o pesquisador observou que as turbinas eólicas não são projetadas no Brasil, ou seja, a indústria, na maioria das vezes, apenas fabrica os equipamentos aqui a partir de projetos feitos no exterior. “Para cada tonelada de minério de ferro exportado, o Brasil recebe 75 dólares, enquanto uma tonelada de equipamento tecnológico exportado pode gerar receita da ordem de um milhão de dólares, no caso de uma aeronave, por exemplo. O nosso país precisa mudar o perfil de um exportador de commodities para um exportador de tecnologia”. Para alcançar este cenário ideal, o engenheiro defende ser imprescindível o domínio da tecnologia. “Precisamos saber projetar uma turbina eólica e poder fabrica-la, e não apenas receber os projetos prontos”.

Outra proposta  da tese é a de ajudar o Brasil a estabelecer uma legislação de ruído ambiental apropriada para turbinas eólicas, o que ainda não existe. “Quando um país não tem uma legislação específica sobre uma nova tecnologia, aplica-se a geral, o que não é apropriado e pode gerar uma série de problemas. No trabalho fazemos uma indicação de como deveria ser feita a legislação brasileira de ruídos de turbinas eólicas”.

Sobre o software – No desenvolvimento do modelo e na sua programação, Joseph optou por desenvolver um sistema que atendesse à demanda da indústria eólica em termo de agilidade nos cálculos, de forma a permitir estudos de otimização, e também de oferecer à indústria e aos pesquisadores um sistema em código aberto, de forma a possibilitar o seu uso colaborativo, e ajudar a disseminá-lo. O modelo foi implementado no software aberto chamado QBlade, criado na Universidade Técnica de Berlim (TU-Berlin), que calcula o desempenho de uma turbina eólica e permite análise estrutural, mas que não contemplava a parte aeroacústica. “Fizemos a parceria com a Universidade Técnica de Berlin, e introduzimos no QBlade um módulo, chamado PNoise (Poli-Noise), que realiza a análise de ruídos emitidos pelas pás das turbinas eólicas”. O pesquisador conta que a taxa de downloads do software QBlade  cresceu com a contribuição desenvolvida em sua pesquisa, e já teve mais de 17 mil downloads desde a sua disponibilização com a versão aumentada. “Acreditamos que estamos agregando valor às indústrias de todo o mundo, porém a nossa ideia é incentivar a indústria brasileira a fazer aqui as suas turbinas eólicas”.

Sobre as turbinas e aerofólios desenvolvidos – Para obter condições realistas de operação dos aerofólios em turbinas de grande porte, durante o projeto da família de aerofólios SP, Joseph desenvolveu o projeto aerodinâmico de três turbinas eólicas, a Poli 100, Poli 180 e a Poli 220, denominadas com o nome da Escola e em função do diâmetro da turbina. “Desenvolvi essas turbinas básicas, que estão disponíveis na tese e podem ser acessadas por qualquer estudante do mundo para fazer suas pesquisas, pois as indústrias não fornecem os dados completos dos seus equipamentos”. Os aerofólios da família SP foram testados comparativamente no software desenvolvido, revelando reduções significativas de ruído nas condições de operação, e foram  patenteados pela Agência USP de Inovação. Um deles emite um ruído audível para algumas famílias de pássaros, de forma que, na prática, pode funcionar como um alerta aos animais para evitarem se aproximar das turbinas.

“Os aerofólios propostos têm melhor desempenho tanto em termos de aerodinâmica e produção de energia, quanto em emissão e ruídos. Só é possível alcançar isso por meio da tecnologia”, explica o pesquisador.

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