FORMANDO ENGENHEIROS E LÍDERES

FORMANDO ENGENHEIROS E LÍDERES

Conheça Jaime Simão Sichman, novo professor titular da Poli-USP

Carreira Acadêmica

Jaime Simão Sichman é Engenheiro Eletricista e Mestre em Engenharia pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Obteve seu Doutorado em Engenharia de Computação no Institut National Polytechnique de Grenoble (INPG), França. Adicionalmente, foi um dos primeiros alunos a obter um Selo Europeu associado ao seu Doutorado, já que parte de seu trabalho de pesquisa foi desenvolvido no Istituto di Psicologia del CNR, Roma, Itália.  Realizou ainda um breve período de Pós-Doutorado na University of Utrecht, Holanda. Seu principal interesse de pesquisa é a Inteligência Artificial, mais precisamente os chamados sistemas multi-agentes, atuando prioritariamente em temas como raciocínio social, organizacional, simulação baseada em agentes, reputação, confiança e interoperabilidade em sistemas baseados em agentes.

Já orientou e co-orientou 20 alunos de Mestrado, 12 alunos de Doutorado e vários alunos de Iniciação Científica. Juntamente com diversos outros colegas, foi um dos criadores de duas subáreas de pesquisa em sistemas multi-agentes, denominadas respectivamente de Multi-Agent-Based Simulation (MABS) e de Coordination, Organization, Institutions and Norms in Agent Systems (COIN), que originaram uma série de workshops internacionais desde 1998. Publicou e editou mais de 300 obras científicas, incluindo artigos, capítulos de livros, e resumos em periódicos e conferências nacionais e internacionais. É membro do comitê editorial do Journal of Artificial Societies and Social Simulation (JASSS), the Knowledge Engineering Review (KER), the International Journal on Agent-Oriented Software Engineering (IJAOSE), Computational and Mathematical Organization Theory (CMOT) e do Autonomous Agents and Multi-Agent Systems (JAAMAS).

Organizou vários workshops e conferências nacionais e internacionais; em particular, foi Tutorial Chair do AAMAS 2007, Program Co-Chair do AAMAS 2009, General Chair do WCSS 2014, Local Organization Chair do AAMAS 2017 e Workshop Chair do AAMAS 2020. No Brasil, foi General Chair do SBIA/IBERAMIA 2000, Program Co-Chair do SBIA/IBERAMIA 2006 e Local Chair do WESAAC 2013. Foi membro do Conselho Deliberativo da Sociedade Brasileira de Computação (SBC) entre 2005 e 2009, além de ter sido coordenador da Comissão Especial em Inteligência Artificial (CEIA) entre 2000 e 2002. Foi indicado como Distinguished Speaker pela Association for Computing Machinery (ACM) em 2012. É membro do Board of Directors da International Foundation for Autonomous Agents and Multiagent Systems (IFAAMAS).

Na Universidade de São Paulo (USP), ocupou, entre 2010 e 2013, a direção do Centro de Computação Eletrônica (CCE). É Professor Titular do Departamento de Engenharia de Computação e Sistemas Digitais (PCS) da Escola Politécnica (EP) da Universidade de São Paulo (USP), ocupando atualmente os cargos de Chefe do Departamento e de Presidente da Comissão de Pesquisa (CPq) da Escola Politécnica

Entrevista

Ensino

Entrevistador: Qual a sua visão sobre o ensino em engenharia? Como utiliza sua
experiência, tanto na área de pesquisa como no contato com instituições
internacionais, para enriquecer a forma de ensino da Poli e contribuir para a
formação dos politécnicos?

Professor: Sem dúvida alguma, o ensino de Engenharia foi enormemente impactado pela pandemia de COVID-19. Tivemos de reagir muito rapidamente a um novo modus operandi de ensino/aprendizagem, utilizando massivamente tecnologias digitais. No caso de nosso Departamento, em particular, tal migração foi facilitada pelo fato de a computação ser nossa atividade fim. Além disso, a maioria de nossos docentes já utilizava ambientes de aprendizagem digitais, como o e-Disciplinas. Do ponto de vista pedagógico, foram necessários a utilização de aulas invertidas, onde o aluno tem contato anterior com o conteúdo da aula através de vídeos pré-gravados, o uso de aprendizagem baseada em problemas e a avaliação continuada. Tais tecnologias e métodos já eram utilizados na POLI, porém de modo muito mais limitado e dependendo da iniciativa pessoal de alguns docentes. Entretanto, creio que a interação professor-aluno seja insubstituível: ela sempre existirá, porém talvez de modo distinto, sem se limitar ao formato da aula expositiva clássica. No futuro, após o final desta pandemia, certamente tais tecnologias e métodos, e outros que ainda virão, serão mais e mais utilizados entre nós, fazendo com que a POLI esteja em pé de igualdade com as melhores escolas de Engenharia do mundo.

Pesquisa

Entrevistado: O senhor possui uma longa carreira e contribuições na pesquisa científica, quais considera suas principais contribuições para a sociedade brasileira e para comunidade científica? Como professora titular da Poli, qual sua visão e planos para as atividades de pesquisa?

Professor: Sempre fui um grande interessado pela área de Inteligência Artificial (IA). Meu Mestrado na POLI buscou desenvolver uma ferramenta para visualizar as atividades de um grupo de agentes inteligentes que se dedicavam a solucionar um problema de modo cooperativo. Tal área se denomina sistemas multiagentes. Realizei no exterior um Doutorado multidisciplinar nesta área, pois parte dele foi desenvolvido em um laboratório de Informática e outra parte num laboratório de Psicologia Social. Aliás, também tive um aprendizado multicultural, pois os laboratórios se localizavam em países diferentes (França e Itália), com culturas, inclusive acadêmicas distintas. O projeto de meu Doutorado foi demonstrar como agentes autônomos podem atingir melhor seus objetivos caso conheçam seus limites e as possibilidades de interação com os outros. Em particular, juntamente com alguns colegas, criamos subáreas de pesquisa neste domínio, denominadas simulação baseada em multiagentes (MABS) e coordenação, organização, instituições e normas em sistemas de agentes (COIN), que geraram comunidades de pesquisadores ativas há mais de 20 anos.

Creio que fui também um grande incentivador da área de sistemas multiagentes no Brasil, pois fui o primeiro Doutor na área que retornou ao país. Participei da criação de um workshop nacional na área (WESAAC) e trouxe para São Paulo, em 2017, o AAMAS, mais importante Congresso da área, quando este ocorreu pela primeira vez na América Latina. Este evento me deu muita satisfação, pois possibilitou que jovens alunos brasileiros pudessem ter um contato com os expoentes da área. Por outro lado, como Presidente da Comissão de Pesquisa da POLI, tenho também incentivado a formação de grupos de agentes (desta vez humanos) cuja complementaridade de conhecimento e de culturas possa resolver problemas de pesquisa mais relevantes para a sociedade. Tais grandes projetos, como os CPEs, Unidades Embrapii, CEPIDs propiciam uma maior integração entre os docentes da POLI e da USP, que por vezes desconhecem o que os colegas de outro Departamento estão pesquisando. Acredito que a pesquisa interdisciplinar, na qual um pesquisador possa ser influenciado por outro de outra área, cria oportunidades valiosas para o avanço da ciência.

 

Extensão

Entrevistador: A Poli possui várias atividades e grupos de extensão, como atua neste pilar da USP? Como você vê a contribuição direta da Poli com a sociedade?

Professor: Certamente, os grupos de extensão da POLI são inúmeros e prefiro não citar nenhum em particular para não ser injusto com os outros. Trazem visibilidade para a Escola na mídia, e mais do que isto, fazem com que os alunos se engajem em projetos desde os primeiros anos da Escola, às vezes quebrando as barreiras de cursos e ano de ingresso. São muito importantes para propiciar aos alunos a oportunidade de atuar de forma cooperativa, de gerenciar projetos, lidar com percalços, que sempre existirão na vida profissional. Por outro lado, a atuação da POLI em Educação Continuada é um importante fator de contribuição à sociedade. Eu atuo como docente e orientador em alguns destes cursos. Como a velocidade de mudança e atualização do conhecimento em Engenharia é cada vez maior, entendo que os novos resultados e tecnologias geradas por nossas pesquisas devem retornar à sociedade inicialmente através dos cursos de pós-graduação, e depois seguidos pelos cursos de graduação e de extensão, que podem abranger um número maior de engenheiros do mercado que precisam atualizar seus conhecimentos.

Visão de Liderança

Entrevistador: Como o senhor enxerga a “Universidade do Fulturo”? E como pretende contribuir para a Poli se tornar a Universidade que descreveu?

Professor: Esta é uma pergunta difícil de ser respondida. Creio que existam visões distintas do que seria esta Universidade do Futuro. Basicamente, creio que a função da Universidade é formar cidadãos e profissionais que possam contribuir para melhorar as condições de nosso país, em particular tornando nossa sociedade menos desigual. Um Engenheiro do futuro precisa levar em conta não apenas os avanços tecnológicos de sua atuação, mas também os seus impactos econômicos, sociais e ambientais. Em minhas aulas sempre tento salientar tais aspectos. Por exemplo, ministro uma disciplina de Inteligência Artificial para os alunos do último ano do curso de Engenharia de Computação, e sempre saliento o problema de viés em aprendizado de máquina, indicando quando possível leituras complementares. Acredito também que nossa postura em sala de aula sempre serve de exemplo para os nossos alunos. Professores não são infalíveis, podem cometer equívocos, por exemplo ao corrigir uma prova, e voltar atrás e corrigir um erro é um exemplo para a vida profissional destes alunos: se um professor da POLI pode admitir seu erro e voltar atrás, eu também posso! Tratar todos com respeito, independentemente do papel que desempenham, ter uma postura ética adequada, sem fazer uso privilegiado da relação assimétrica de poder professor/aluno, também faz com que tais posturas sejam mais facilmente adotadas por nossos alunos no futuro. Finalmente, devemos sempre fomentar sempre a curiosidade dos alunos: o Engenheiro do futuro talvez nem trabalhe nas carreiras que hoje são oferecidas pela FUVEST, talvez nem existam mais, mas uma coisa será certa: ele terá de aprender sempre, continuamente. Aprender a aprender. A curiosidade certamente faz parte da vida de um pesquisador, nosso desafio é incutir esta curiosidade em nossos alunos e futuros profissionais.

Entrevistador: Gostaria de acrescentar algo que não pontuamos na entrevista?

Professor: Eu diria aos nossos alunos e jovens docentes que sempre devem correr atrás de seus sonhos, independentemente de estes parecerem longínquos ou inatingíveis. Meus avós eram muito pobres, e emigraram da Europa Oriental para o Brasil no início do século 20, fugindo de perseguições religiosas. Meus pais aqui nasceram, mas tiveram de trabalhar desde muito cedo. Eu fui o primeiro membro da minha família a concluir um curso superior. Com enormes sacrifícios, meu pai financiou meus estudos no antigo primário e ginásio, no Colégio Renascença. Obtive por 3 anos uma bolsa de estudos no então curso colegial, que realizei no Colégio Bandeirantes. Caso não tivesse me esforçado para entrar na POLI, meus pais não teriam condição de pagar uma faculdade privada para mim. Graças também à FAPESP, pude realizar meu Doutorado no exterior, que alavancou minha carreira.  Hoje sou professor titular da POLI, um sonho realizado.

Como dizia o poeta e dramaturgo espanhol Pedro Calderón de La Barca, “toda a vida é sonho e os sonhos, sonhos são.”

 

Print Friendly, PDF & Email