FORMANDO ENGENHEIROS E LÍDERES

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O Duplo Diploma de Tatiana Theoto: uma sucessão de re(encontros)

 

Numa noite em 2011, no que parecia ser um simples jantar na casa da então adolescente  Tatiana Theoto, uma conversa entusiasmada com um dos grandes amigos de seu pai sobre o filho que faria um intercâmbio pela Escola Politécnica da USP, que lhe garantiria um diploma internacional, fez nascer, nas suas palavras: “Uma sementinha de vontade de ingressar na USP. O Duplo Diploma é o diferencial que eu vi da Poli para as outras faculdades”. 

A jundiaiense continuou estudando com afinco, e ingressou na Universidade, conquistando o 2º lugar no vestibular disputado por cerca de 10 mil pessoas, e sendo uma das 7 mulheres em uma sala de 60 alunos do curso de Engenharia Mecânica. Os números sempre tiveram vez na vida de Tatiana, e hoje conta com graça sobre o dia em que os algarismos ficaram a favor de si e dos colegas, no momento em que descobriram que haviam sido selecionados para o intercâmbio em Munique, na Alemanha.

O grupo de amigos compunha quatro pessoas, contando com a jovem. O que lhes foi dito é que haviam apenas três vagas, e todos eles queriam ir juntos. A conta não fechava. “Eis que no dia da aprovação, eu e dois dos meus amigos descobrimos que passamos, mas na hora bateu o medo – como comemorar quando um de nós não foi chamado? Saindo da sala, vimos o quarto amigo vindo na nossa direção pelo corredor, gritando ‘Eu passei também!’”. Eles ainda não sabiam, mas foram criadas mais vagas e o grupo descobriu que, às vezes, a sorte pode jogar dados com o destino.


                                         [Imagem: acervo pessoal]


Tatiana descreve que é inevitável passar pelo estranhamento inicial de estar em outro país, inserida em outra cultura; mesmo que houvessem colegas de outros anos da Poli na Universidade Técnica de Munique (Technische Universität München – TUM). Segundo a engenheira, a rede de apoio existia para atenuar o choque de cultura, mas como cada um poderia escolher as disciplinas que desejava cursar, nem sempre estavam juntos. Ainda assim, adiciona, isso faz parte de todo o processo de transformação, crescimento pessoal, descoberta de si e a expansão de possibilidades e caminhos que uma experiência como esta proporciona.

 

Sob o sol de Singapura

Profissionalmente, o carimbo do diploma internacional faz diferença dentro e fora do país de origem daquele que o obtém. E a flexibilidade curricular que Tatiana encontrou na Alemanha expandiu suas áreas de atuação, ao passo que caminhava para a instrução sobre gerenciamento na engenharia, o que, se estivesse no Brasil, teria de desdobrar mais tempo entre diversas tarefas e realizá-la por fora de sua unidade de ensino, por meio de disciplinas optativas, ou posteriormente realizar cursos em instituições privadas. 

Na vida pessoal, Tatiana conta que o segundo ano no exterior foi desafiador. A temporada de frio alemã voltava a dar as caras e ela precisava terminar de escrever a tese, mas sentiu que o andamento não fluía como desejava. Sabendo da possibilidade que a TUM concedia de realizar períodos de estudo em outros países, durante o próprio tempo de intercâmbio pré-establecido, resolveu arriscar. “Pensei na Holanda, mas seria trocar seis por meia dúzia. Encontrei Singapura, da qual eu tinha um raso conhecimento por conta de um trabalho de geografia que havia feito na oitava série, mas Singapura é na Linha do Equador, é uma ilha, é quente, é moderna e eu nunca havia ido para a Ásia”. Os pais que esperavam o retorno de Tatiana ao calor brasileiro, para continuarem se correspondendo, tiveram de se adaptar ao fuso de 11 horas de diferença do país banhado pelo calor asiático. 

Além de conseguir desenvolver e finalizar a tese da maneira que desejava, os planos do destino incluíram que ela também conhecesse o atual namorado em Singapura, em mais um combo de coincidências. Ela, brasileira. Ele, alemão. Quando Tatiana foi à Munique para fazer o Duplo Diploma; ele, ao mesmo tempo, veio passar seis meses no Brasil, por meio de um programa de intercâmbio da Unicamp. No entanto, o encontro entre os dois não viria a acontecer em nenhuma de suas terra-mães, mas sim posteriormente numa cidade-estado insular situada ao sul da Malásia. Parece filme, mas essa é uma das graças da vida real: descobrir que arte e vida se alimentam mutuamente.


[Imagem: acervo pessoal]                                          [Imagem: acervo pessoal]


A vida é a arte do encontrar-se

Voltando ao Brasil, tendo terminado a faculdade e estagiando na empresa de consultoria empresarial, Boston Consulting Group (BCG), Tatiana optou por retornar à Alemanha por conta do relacionamento pessoal. “Fui honesta com eles (BCG) e comigo também. Queria estar lá e arrumar emprego lá. Eles foram compreensíveis e eu fui”. Além disso, a engenheira conta da dificuldade posterior a essa escolha em relação à língua. Quando estudava na Poli, fazia parte do Centro Acadêmico; participou do PACE (Partners for the Advancement of Collaborative Engineering Education); lecionava aulas de matemática em um cursinho pré-universitário popular e tinha pouquíssimo tempo para estudar o alemão.

Quando foi à Alemanha por meio do programa de Duplo Diploma, foi com o requerimento mínimo necessário para se adaptar, mas o choque de dialetos que percebeu quando retornou a Munique para morar, fez com que voltasse ao estudo  do alemão. Além disso, as relações interpessoais precisavam de mais aprofundamento e investimento, por conta da diferença entre as culturas brasileira e alemã, ainda mais pela perspectiva do contato pessoal. Após esses processos, trabalhou como prestadora de serviços para a BMW por um ano e meio, mas com a estagnação da função, entrou em contato com o BCG do Brasil pedindo uma carta de recomendação para a filial na Alemanha. Fez a entrevista, e conta entre risos que hoje é como se estivesse fazendo um Duplo Diploma no BCG – primeiro em São Paulo e agora em Munique.

Perguntada sobre as relações pessoais, a engenheira revela sentir saudades dos familiares e da comunidade que faz parte no Brasil, mas afirma que não demora a voltar. Os amigos que fez durante a graduação e o período do intercâmbio continuam presentes: os paquistaneses, os russos, os alemães, os americanos, os de Singapura e, é claro, os politécnicos. A gama de amizades incluiu até um convite para um casamento na Índia. “A pessoa que eu era antes do intercâmbio não imaginava nada disso”. E toda essa mobilidade e interculturalidade que o intercâmbio concedia permitiu também que Tatiana fizesse diversas viagens pela Europa durante o período do Duplo Diploma. “Brinco que conheço a Europa melhor que meu namorado, porque estando aqui eu pude conhecer muitos lugares. E ele conhece o Brasil melhor que eu, porque quando esteve aí por seis meses, quis conhecer tudo também”. 

 

        Tatiana na Oktoberfest de Munique, festival de tradições germânicas [Imagem: acervo pessoal]


“Eu sinto que a experiência do DD está ligada ao propósito da universidade: você estar ali no campus unido ao tanto de gente diferente de você, fazendo uma troca e abertura da cabeça, promovendo crescimento. O Duplo Diploma é uma extensão disso, da comparação de realidades, entendimento do mundo, ver como as coisas funcionam hoje e como podem ser no futuro.” Tatiana ressalta que o carimbo mais importante para o currículo tem a ver com essa mistura, com esse “encontrar-se”, muitas vezes, fora do já conhecido e acessado.

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